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Programa Terra Legal aumenta pressão sobre área indígena não demarcada

InfoAmazonia

Por Daniel Santini*

Programa Terra Legal promove ocupação de território do povo Jaminawá no Amazonas. Imagens de satélite indicam que invasões são acompanhadas de aumento do desmatamento

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Moradores da aldeia Kaiapuká reclamam de desmatamento, abertura de pastos para gado, caça e pesca predatória . Foto: Rosenilda Nunes Padilha

O Programa Terra Legal, iniciativa de regularização fundiária do governo federal, promoveu a invasão de terras indígenas na fronteira do Amazonas com o Acre, agravando a situação do povo Jaminawá e influenciando no aumento do desmatamento na região. O órgão loteou e incentivou a ocupação de parte da terra indígena Kaiapuká por meio do programa oficial, que conta com apoio do governo alemão pela agência oficial de cooperação, a GIZ, da sigla em alemão para Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit. As informações são parte do relatório ''As contradições da cooperação alemã na Amazônia'', organizado pela Fundação Rosa Luxemburgo em parceria com o Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais.

A terra indígena (TI) Kaiapuká aparece como Caiapucá no site da Funai, que informa tratar-se de área “tradicionalmente ocupada” e diz que sua demarcação está ''em estudo''. Os Jaminawá se dividem em três aldeias principais, Kaiapuká, Sete Estrelas e Santana, e cobram do governo federal a homologação imediata do território. A Kaiapuká não é a única terra indígena ameaçada pela lentidão da Funai, e o documento traz também uma relação organizada pelo Conselho Indigenista Missionário, que aponta outros onze casos na mesma situação.

O relatório foi produzido por Winnie Overbeek, do Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, e é parte do acompanhamento de impactos de projetos REDD+ no Acre. O trabalho envolveu visitas a campo e análise detalhada de documentos, e aponta que ''a Alemanha é considerada a principal  financiadora da implementação de mecanismos de economia verde no Estado e tem apoiado programas de REDD+ com aportes feitos pelo Banco de Desenvolvimento KfW (Kreditanstalt für Wiederaufbau), propagandeando como parte dos resultados justamente a demarcação de terras indígenas''. O documento também inclui análise de imagens de satélite e um mapa do Infoamazonia que permite visualizar como, junto com a ocupação irregular das terras indígenas, houve avanço do desmatamento nos últimos dez anos.

A área em que vivem os Jaminawá fica entre o Rio Purus e a terra indígena Igarapé Capanã (em laranja no mapa por já ter sido demarcada com seus limites oficializados). A floresta em que está a terra indígena Kaiapuká pode ser acessada a partir de Sena Madureira, no Acre, e encontra-se no caminho do desmatamento. Como é possível observar, há registros claros do avanço da devastação na área norte do rio, justamente a que os moradores da Kaiapuká esperam ver demarcada:


O documento lembra que áreas indígenas demarcadas ajudam a frear o desmatamento e que o loteamento na terra Kaiapuká viola as regras do próprio Terra Legal. Diz o texto: ''Na teoria, os assentamentos devem ser feitos em áreas ainda não destinadas, ou seja, não devem ocorrer em terras indígenas, florestas públicas, áreas de conservação do Estado ou áreas militares, conforme anunciado na página de apresentação do programa. Na prática, porém, a sobreposição é uma realidade, como é possível visualizar no caso dos Jaminawá. Em uma inversão de papeis, em vez de garantir a preservação da área pleiteada pelos indígenas, pelo menos até a conclusão do processo de demarcação, o governo federal acabou incentivando as invasões ao lotear o território.”

Baixe o estudo na íntegra (PDF).

* Daniel Santini é jornalista e trabalhou no site ((o)) eco e no projeto InfoAmazonia. Hoje atua como coordenador na Fundação Rosa Luxemburgo e escreveu este texto a convite do InfoAmazonia.