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Uso do gás natural reduz poluição provocada pela cidade de Manaus

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Por Vandré Fonseca

A substituição de óleo combustível e diesel em termelétricas de Manaus significou uma redução 73% na poluição provocada pela queima de combustíveis fósseis pela cidade. A troca do combustível resultou também na diminuição em 55% na emissão de gases de efeito estufa (metano e dióxido de carbono). A conclusão é de um estudo em discussão na revista científica Atmospheric Chemistry and Physics dos pesquisadores da campanha científica Green Ocean Amazon, a GoAmazon.

Sem o gás natural, Manaus emitia 16 toneladas de monóxido de carbono (CO) e 129 toneladas de óxidos de nitrogênio (NOx) por dia. Em 2014, quando 65% da geração das termelétricas era movida a gás natural, estes números caíram para 12 toneladas e 52 toneladas por dia, respectivamente.

A usina termelétrica Mauá, em Manaus, é uma das fontes de energia da cidade. Foto: Divulgação

Ambos os gases são tóxicos. O CO se combina com a hemoglobina no sangue, reduzindo o transporte de oxigênio para as células. Em grandes concentrações pode ser fatal. Em baixas, causar dores de cabeça enjoos e outros sintomas. Já os óxidos de nitrogênio têm efeitos diversos. O dióxido de nitrogênio, por exemplo, pode provocar problemas respiratórios, irritações em olhos, garganta, nariz e outros órgãos.

Os dados estão em um artigo ainda em discussão, mas que já está disponível na revista científica Atmospheric Chemistry and Physics. No estudo, foram traçados três cenários diferentes: o primeiro e mais pessimista, com os geradores sendo movidos com a queima de óleo; um intermediário, correspondente à situação de 2014, com o gás natural movendo 65% dos motores e turbinas; e um ideal, com 100% de substituição, previsto para 2018.

Se todas as usinas de Manaus passassem a utilizar o gás natural como combustível, a cidade estaria emitindo 89% a menos gases de efeito estufa. Todos os cenários levaram em conta que aproximadamente um quarto da energia elétrica de Manaus é fornecida pela hidrelétrica de Balbina. Hoje, a cidade de Manaus é abastecida também pela usina de Tucuruí, no Tocantins, uma fonte que não estava prevista nos cenários desenvolvidos no estudo.

A pesquisa faz parte da campanha científica Green Ocean Amazon, ou GoAmazon, que teve como objetivo analisar como as emissões de gases urbanas de Manaus interagem com as emissões da floresta amazônica. A GoAmazon reuniu diversos projetos científicos financiados pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos, pelas fundações de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e do Amazonas e outros parceiros.

O estudo demonstra ainda que os municípios de Manacapuru e Iranduba, a sudoeste da região metropolitana de Manaus, são os maiores beneficiados pelo corte na emissão de poluentes. “Pode haver consequências tanto para as populações humanas destes municípios, quanto para a floresta”, afirma o coordenador do projeto pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA), o físico Rodrigo Augusto Ferreira de Souza.

Para a floresta amazônica, o ozônio (O3) é o grande vilão. O gás é resultante das emissões urbanas. Apesar de ser importante em altitudes elevadíssimas, na atmosfera ele tem efeitos nocivos. Outro estudo realizado durante a campanha GoAmazon já havia revelado possíveis danos à natureza provocados por esse gás.

“O ozônio é um gás fitotóxico, um poderoso oxidante que afeta a fotossíntese da floresta”, afirma o coordenador do GoAmazon, o físico Paulo Eduardo Artaxo Netto. Ele explica que o ozônio é resultado das reações entre o isopreno (C5H8) – um poluente associado à queima de combustíveis fósseis – e aerossóis orgânicos emitidos naturalmente pela mata.

Paulo Artaxo conta que, devido à queima de derivados de petróleo na cidade de Manaus, a concentração de ozônio na região aumenta em até seis vezes. Enquanto na Amazônia, a concentração do gás fica entre 8 a 10 partes por bilhão, na pluma de emissões de Manaus chega a mais de 60 partes por bilhão, o que é semelhante à cidade de São Paulo.

Chuvas
O GoAmazon descobriu também um inédito sistema de formação de chuva: “Um mecanismo de partículas em altas altitudes, de 14 a 15 quilômetros, que era desconhecido da ciência e só ocorre em floresta tropical”, destaca Paulo Artaxo.

Para que a umidade sobre a floresta se transforme em chuva, é necessária a ação de partículas minúsculas em suspensão ou gases, conhecidos como aerossóis. Em contato com este material, o vapor de água na atmosfera se condensa, formando as gotas de chuvas. Mas cientistas ainda estavam intrigados, pois aerossóis formados ao nível do solo ou a altitudes de até quatro ou cinco quilômetros não eram suficientes para formar a grande quantidade de chuva que cai sobre a Amazônia.

“Descobrimos que emissões (aerossóis) da floresta amazônica são transportadas a altas altitudes e essas emissões de gases se transformam em partículas e voltam para formar gotas de chuva”, explica o físico da Universidade de São Paulo. Artaxo afirma que a descoberta resolve uma questão que intrigava pesquisadores sobre como chuvas tão intensas eram possíveis na região sem que partículas suficientes fossem formadas em nível do solo ou a altitudes de quatro a cinco mil metros.

Qualidade do ar
Outro fruto do GoAmazon está em geração na cidade de Manaus. Rodrigo Souza adianta que a cidade vai contar, em breve, um sistema de monitoramento da qualidade do ar, em um trabalho conjunto com o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM). Apesar de quase dois milhões de habitantes, não existe um sistema de avaliação permanente da qualidade do ar na capital amazonense.

Os equipamentos da campanha científica, que haviam sido montados em Manacapuru, cidade da região metropolitana de Manaus, já foram desmontados. Enquanto estiveram na região, serviram para juntar um conjunto de informações, suficientes para conhecer um pouco mais sobre como a cidade e a floresta se relacionam, além de deixar pesquisadores prontos para aprofundar e aproveitar esse conhecimento.

Equipamentos de medição do GoAmazon montados em Manacapuru. Foto: Acervo GoAmazon e LBA